RESENHA | Pulp, de Charles Bukowski

Bukowski traz em “Pulp”, um dos últimos livros escritos por ele, uma narrativa mais madura. Diferentemente de “Mulheres”, no qual são narradas muitas aventuras sexuais e relações perturbadoras, e de “Fabulário Geral do Delírio Cotidiano”, composto de crônicas que retratam sempre o submundo repleto de alcoólatras e prostitutas no qual o autor parece viver, Pulp vem com uma nova proposta. Uma narrativa bem menos submundana do que nos outros livros do autor.

O detetive Nick Belane recebe alguns trabalhos que lhe parecem estranhos, mas, como ele só tem essa fonte de renda e, como se diz sempre, “o melhor detetive de Los Angeles” encara os desafios. São trabalhos bem aleatórios, como encontrar o Pardal Vermelho. Não me pergunte que Pardal Vermelho é esse – eu que li o livro e o personagem que o viveu sabemos tanto quanto você.

Em alguns momentos, o personagem chega até a se questionar se estaria ficando louco, se tudo não seria uma ilusão. Visitas da Dona Morte, que ele chega a pensar que seria alguém fantasiado, mas esse alguém demonstra o poder que tem e chega a matar pessoas várias vezes na frente do protagonista. Como todos os outros livros do autor, Pulp traz várias sacadas muito boas de momentos cotidianos que todos vivemos e, ao ler, nos perguntamos: como nunca pensei em escrever isso antes?

“Esperamos e esperamos. Todos nós. Não saberia o analista que a espera é uma das coisas que faziam as pessoas ficarem loucas? Esperavam para viver, esperavam para morrer. Esperavam para comprar papel higiênico. Esperavam na fila para pegar dinheiro. E, se não tinham dinheiro, precisavam esperar em filas mais longas. A gente tinha de esperar para dormir e esperar para acordar. Tinha de esperar para se casar e para se divorciar. Esperar pela chuva e esperar pelo sol. Esperar para comer e esperar para comer de novo.”

Continuando esse trecho, ele traz a crueldade nua dos pensamentos da maioria de nós:
“A gente tinha de esperar na sala de espera do analista com um monte de doidos, e começava a pensar se não estava ficando doido também”.
O diferencial desse livro é que, em poucos momentos, aparecem cenas violentamente degradantes, como o alcoolismo extremo, bastante presente na maioria das obras do autor, ou relações conflituosas e perturbadoras entre ele e várias mulheres, que culminam em cenas de sexo inescrupuloso, vômitos na privada do banheiro e xingamentos entre quase desconhecidos. Bukowski é esse tipo de autor. A maioria das pessoas ama ou odeia. Há quem leia a sinopse e só em ver que é chamado de “velho safado” já rotula o livro e o abomina. E há quem ame as cenas degradantes e ultra-reais muito marcantes nas narrativas do autor. Com toda a certeza, suas obras não são as melhores opções para serem lidas em momentos mais melancólicos ou mais sensíveis ou mesmo em tempos de procura por mais cultura e conhecimentos. São histórias bem cruas, agressivas, que doem no leitor pela exposição das partes feias do mundo que todos fingimos que não existe. Mas são absolutamente verdadeiras e atuais.