O elenco de Sicário: Dia do Soldado (Sicário: Day of the Soldado, 2018) trás Josh Brolin e Benicio Del Toro reprisando seus papéis do primeiro filme, Sicario: Terra de Ninguém (Sicario, 2015), não contando com o retorno da personagem de Emily Blunt que esteve no primeiro filme. O filme se propõe colocar os personagens principais no México com intuito de causar uma guerra entre os cartéis. O governo americano é quem contrata Matt Graver (Brolin), para começar essa guerra para evitar que os cartéis passem terroristas pela fronteira e eles então financiam a operação para alcançarem esse objetivo.
Enquanto temos o “lado americano” realizando essa operação com apoio do Governo dos Estados Unidos, seguimos também o personagem Miguel Hernandez (Elijah Rodriguez) do “lado mexicano” da fronteira envolvido com os cartéis e com a passagem de imigrantes pela fronteira para chegar aos Estados Unidos. Independente do lado posposto a ser seguido, a narrativa toma um caminho muito negativo e seus personagens são as piores versões de si. Não é um filme para se assistir e esperar algo bom do mundo, mas um filme que mostra o que há de ruim tanto do lado do governo dos EUA quanto o lado dos cartéis de drogas.
Diferente do primeiro filme, Dia do Soldado (escrito por Taylor Sheridan e dirigido por Stefano Sollima) mostra uma aproximação mais sentimental e menos fechada quando se trata dos seus personagens. O silêncio e jogo de expressões aqui não é tão presente e chegamos a descobrir mais sobre alguns personagens, em especial Alejandro (Del Toro). Já o tratamento do filme quanto às personagens femininas é tão bom quanto o de qualquer filme de ação feito por homens. Ou as mulheres são as “vadias frias” ou então elas são damas em perigo que necessitam de homens para serem salvas, não lhes é dada qualquer tridimensionalidade. As personagens de Cynthia Fords e de Isabela Moner não fazem muito senão ordenar mortes a sangue frio e chorar, respectivamente falando.
Importante ressaltar que este é o primeiro filme indie americano em décadas que vai ter lançamento na Arábia Saudita e será também o primeiro filme para maiores de dezoito anos a ser lançado naquele país. O filme trás alguns assuntos de extrema importância para os dias de hoje, mas a forma com que a trama trata todos esses assuntos meio que se perde e, assim, perde a relevância. Terrorismo é um ponto de partida para a trama e ele mesmo é esquecido dentro do filme. Combate às drogas não se dá como um dos enredos do filme, embora a proposta possa parecer ser isso, porque o filme em determinado momento se torna sobre vingança, retribuição e perdão.
Há quem veja a humanização dos personagens como um ponto fraco do filme, principalmente em relação ao primeiro Sicário, mas trazer um lado mais fraco e real a personagens apenas os torna mais tridimensionais em vez de pessoas sem qualquer aspecto bom ou emocional. Isso trouxe mais realidade aos personagens dos filmes. Durante parte do filme os personagens se mostram como seres de sangue frio seguindo ordens, ou seguindo seus desejos de vingança, sem qualquer qualidade ou demonstração de emoção e essa parte do filme é a que mais cansa. Ao mostrar que os personagens são pessoas reais com emoções o filme ganha alguns pontos.
A composição sonora do filme trabalha muito bem com a narrativa e é feita por Hildur Guonadóttir, que colaborou na trilha do primeiro filme com o recém falecido Jóhann Jóhannsson, como uma solista de violoncelo. Todo o filme trabalha em harmonia e as cenas mais introspectivas ou de tensão vêm acompanhadas de sons que ajudam a compor a cena como um todo de forma que capture a quem estiver assistindo. Outro detalhe muito relevante é a fotografia, feita por Dariusz Wolski, capaz de trabalhar muito a dualidade entre os ambientes não só físicos mas também os psicológicos. Como o filme tem muitas cenas onde os personagens apenas contemplam suas escolhas ou o que está acontecendo, a fotografia e a sonografia trabalham bem para que estes momentos não sejam chatos ou tediosos.
A regra das três vezes é trazida em narrativa, considerando que os personagens de Del Toro e de Elijah Rodriguez se encontram em três momentos diferente durante o filme e cada um desses momentos trás consequência para a história. A forma com que os dois personagens terminam se cruzando se dá de forma fluida e antes de acontecer já é capaz de se entender como esse encontro vai ocorrer.
Esse filme não é um filme para pessoas de estômago fraco, considerando a quantidade de cenas graficamente violentas presentes. É um filme cujas as cenas violentas também pedem as vezes o desprendimento da realidade, pois há certos elementos bem fantasiosos tratando disso. O ato final do filme resolve as questões apresentadas do enredo, excluindo totalmente toda a questão do terrorismo apresentada no início. Os personagens terminam criando os próprios problemas e seus obstáculos nascem diretamente disso. Enquanto o primeiro filme pode ser visto sobre a militarização da polícia e a mescla entre os militares e a polícia o segundo remove mais o aspecto policial sobre a narrativa.
Cineasta graduade em Cinema e Audiovisual, produtore do coletivo artístico independente Vesic Pis.
Não-binarie, fã de super heróis, de artistas trans, não-bináries e de ver essas pessoas conquistando cada vez mais o espaço. Pisciano com a meta de fazer alguma diferença no mundo.