“Vida. Morte e decadência. Que alimenta nova vida. Calor. Frio. Paz. Violência. E entre isso tudo? Equilíbrio”
Já dizia o sábio Sirius Black em Harry Potter e a Ordem da Fênix: “Todos temos luz e trevas dentro de nós. O que nos define é o lado em que escolhemos agir”. Essa frase define muito bem a mensagem central de Star Wars: Os Últimos Jedi (Star Wars: Episode VIII – The Last Jedi, 2017), e em torno dessa temática que acho interessante fundamentar este texto. Porque com este filme Star Wars se provou ser muito mais do que uma “guerra nas estrelas”, com um herói sem falhas e um vilão motivado pelo mal puro. O Episódio VIII trouxe de fato o equilíbrio ao mostrar que o herói pode fazer escolhas péssimas, que podem causar danos irreparáveis, assim como o vilão pode fazer o bem, de alguma forma que seja.
Star Wars: Os Últimos Jedi começa exatamente a partir de onde O Despertar da Força acabou, com Rey (Daisy Ridley) encontrando Luke Skywalker (Mark Hamill) em seu refúgio em Ahch-To, devolvendo a ele o seu sabre e esperando que o grande Mestre Jedi ajude a Resistência a defender a galáxia das ameaças da Primeira Ordem. Enquanto isso, o grupo liderado pela General Leia Organa (Carrie Fisher) foge das investidas da armada do Supremo Líder Snoke (Andy Serkis), com Finn (John Boyega), Poe (Oscar Isaac) e Rose (Kelly Marie Tran) correndo contra o tempo para ajudar a Resistência da melhor forma que conseguirem.
Com um período de 2 anos entre as produções dos Episódios VII e VIII, teorias que pudessem responder aos questionamentos levantados pelo filme de J.J. Abrams surgiram de todos os cantos, em quantidade suficiente para compôr livros e livros de suposições. Quem são os pais de Rey? Por que Luke se isolou? Quem é Snoke? E além dessas e outras tantas perguntas, também não faltaram expectativas. Kylo Ren (Adam Driver) pode se tornar um vilão à altura de Vader? Rey se tornará uma Jedi? Kylo Ren mudará de lado? Rey mudará de lado? Até mesmo a campanha de marketing do filme brincou com estas duas últimas perguntas, deixando todos os fãs bastante receosos.
O filme estreou e dividiu a opinião do público. Provavelmente você já escolheu seu lado na discussão e já deve ter visto muitas críticas do filme até agora, mas aqui focarei em Kylo Ren e Rey, os dois protagonistas desta história. De um lado, o filho dos heróis Han Solo e Leia Organa, neto de Anakin Skywalker, sobrinho de Luke Skywalker, um grande prodígio na força, com um futuro brilhante à frente (“o potencial de linhagem, um novo Vader”). Do outro, uma coletora de sucata que foi abandonada pelos pais, e que sobrevive dos restos de peças de naves no esquecido planeta Jakku, sem nenhuma perspectiva de chegar a lugar algum (“você não tem lugar na história, você não é ninguém”). Mas, mudamos o ângulo vemos algo diferente. De um lado, um jovem que se sente abandonado pelos pais, e os renega, que se sente traído pelo tio, e o vê como uma ameaça, e que busca destruir o que ver pela frente. Do outro, uma jovem que mesmo depois de anos sem ver os pais, continua com esperança de revê-los; que se depara com um droide em perigo, que nada tem a ver com ela, e que poderia bancar semanas de alimento, mas mesmo assim decidi salvá-lo.
Esse lado de cada um é muito bem exposto por seus temas musicais magistralmente criados por John Williams. O tema de Kylo possui várias camadas, como se quisesse representar o quanto o personagem tenta se esconder por trás de uma máscara, se comportando como um grande vilão, mas que por dentro está se corroendo. Dá pra perceber isso aqui, em 5:55, com uma melodia sinistra que se mistura com uma expressão de dor, culminando no resultado final, o papel de Kylo na Primeira Ordem. Já o tema de Rey é aventuresco e leve, e representa sua jornada desde Jakku até ela fazer parte da Resistência, com variações brilhantes de Williams, que mistura seu tema com os temas de seus desafios, como o próprio tema de Kylo (3:22) e o tema da Força (4:03).
É interessante pensar que algo que foi a reclamação de muitos fãs em Star Wars: O Despertar da Força (Star Wars: Episode VII – The Force Awakens) se tornou um ponto de discussão em Os Últimos Jedi: Kylo Ren não é um vilão como Darth Vader, ele é “apenas uma criança em uma máscara”. Sim, e esse é o ponto. É dito na novelização do Episódio VII que Snoke seduzia o então Ben Solo para o lado negro da Força desde que ele nasceu, e um a um, seus familiares falharam em dissuadi-lo de deixar a luz. Consumido pela raiva, pelo sentimento de abandono e de vingança, Ben Solo fez a escolha de deixar tudo aquilo que ele conhecia e que ele era para trás para se tornar Kylo Ren. Enquanto isso, Rey, alguém que nunca havia antes segurado um sabre de luz (como muitos também adoram reclamar), descobriu ser capaz de usar a Força, e foi em busca de alguém para ensiná-la a aperfeiçoar este dom. Rey, a garota sem pais e sem futuro, e que poderia usar este novo poder para benefício próprio, fez a escolha de seguir em uma missão em prol de uma causa que ela tomou como sua também.
Eis então que Kylo Ren, o poderoso mestre dos Cavaleiros de Ren, encontra a garota, e percebe que ela é muito mais do que ele pensava, alguém com o potencial para se igualar a ele nas habilidades com a Força. Alguém para liderar junto a ele a famigerada nova ordem da galáxia (neste momento o fantasma de Anakin revira os olhos). Já Rey, a ninguém do planeta Jakku, vê que o monstro que matou Han Solo, figura que ela tanto admirava, e que agora ameaça o restante dos seus amigos, na verdade está sendo torturado por um conflito interno, e consegue ver luz em alguém que todos já assumem como um caso perdido. Em uma das melhores cenas de Os Últimos Jedi, ambos são confrontados com a chance de mudar de lado. E novamente, eles fazem uma escolha. E esperamos que isso determine a trajetória de ambos daqui para frente.
Mesmo com seus problemas o filme consegue passar mensagens fortes, como a de que não importa de onde você é ou de quem você é filho, a Força também está com você, e você também pode se tornar um grande nome na história. Repleto de simbolismos sobre o equilíbrio, o filme aborda o tema melhor do que qualquer outro filme da saga, e abre o caminho para novas histórias cheias de potencial, muito além da saga da família Skywalker.
Star Wars: Os Últimos Jedi está indicado em quatro categorias do Oscar: Edição de Som, Mixagem de Som, Efeitos Visuais, e Trilha Sonora, dando a 51ª indicação para John Williams, pessoa com o maior número de indicações ao prêmio.
Formada em Comunicação Social, editora de conteúdo do Cinema com Rapadura, Louise Alves é Potterhead, Marvete e viciada em trilhas sonoras. Seu gênero favorito é ação, mas sabe todas as falas de Orgulho e Preconceito. Odeia gente que acorda de bom humor e nunca leva desaforo pra casa.