Dentro da cinematografia contemporânea cearense, o nome de Petrus Cariry é destaque certo, seu último filme, Clarisse ou Alguma Coisa Sobre Nós Dois (2015) vem para fechar a nominada trilogia da morte, contudo o filme que chama atenção para a criação desse texto é o segundo longa da trilogia – Mãe e Filha (2011).
O filme se passa em uma cidade fantasma no interior do Ceará e conta a história da filha, que retorna para a mãe, carregando o filho natimorto para que a mãe (no caso a avó) o conheça e o abençoe para que ele possa ser enterrado. Apesar da sinopse linear que escrevi, o filme em si é totalmente simbólico. Começando pela fotografia e enquadramentos, tecnicamente o filme é perfeito, todo o jogo de luz e sombra que as cenas noturnas têm (muitas vezes lembrando os quadros de Goya e Caravaggio), os enquadramentos dos espaços são muito bem feitos, por vezes vemos as personagens em um espaço completamente harmônico dentro do filme, muito isso se dá às influências e referências que o diretor impõe em seu filme, há referência direta à pintura em um frame em que aparece o quadro “Ofélia”, de John Everett Millais, esse quadro aliás, não é somente referência artística, mas também dramatúrgica, ao reinventar a personagem Ofélia da peça de Shakespeare.
No tocante ao enquadramento, o filme faz referência, embora não explícita, a um cinema de gênero, há alguns planos, como o que a filha conversa com a mãe sob luz de velas, que lembra, e muito, os plano da estalagem em No tempo das diligências (Stagecoach, 1939), de John Ford. Outro enquadramento que lembra muito outro filme de Ford é quando a filha caminha em um corredor cheio de fotos, a câmera fixa e a personagem caminha em direção ao horizonte enquanto sobe uma trilha, a referência aqui pode ser encontra no filme Rastros de Ódio (The Searchers, 1956).
Porém o grande destaque aqui é a constante presença da morte durante o filme, a começar pelo filho já morto, e a cidade fantasma. A relação mãe e filha também parece estar morta, há presença muito simbólica de quatro vaqueiros que seriam os quatro cavaleiros do apocalipse, há outra cena também, que prenuncia a morte, dois cachorros brigam em frente aos quatro vaqueiros, a cultura popular diz que cães veem coisas e prenunciam coisas como a morte.
O filme de Petrus é, sem dúvida, um dos expoentes do cinema contemporâneo recente no Ceará. Sua linguagem forte, rigorosa e simbólica constroem um filme poderoso visualmente e com uma história comovente e infinitas interpretações. É um filme que merecia, sem dúvida, um reconhecimento maior tanto no Brasil quanto internacionalmente.
Atual Vice-presidente da Aceccine e sócio da Abraccine. Mestrando em Comunicação. Bacharel em Cinema e formado em Letras Apaixonado por cinema, literatura, histórias em quadrinhos, doramas e animes. Ama os filmes do Bruce Lee, do Martin Scorsese e do Sergio Leone e gosta de cinema latino-americano e asiático. Escreve sobre jogos, cinema, quadrinhos e animes. Considera The Last of Us e Ocarina of Time os melhores jogos já feitos e acredita que a vida seria muito melhor ao som de uma trilha musical de Ennio Morricone ou de Nobuo Uematsu.