A numerologia explica que o número três tem um significado especial. Representa a perfeição. Muitos estudiosos de simbologia e numerologia apontam que vários exemplos dessa perfeição vem contemplada com o número três. Em seu livro Dicionário de Simbologia, Manfred Luker afirma que o número 3: “significa a superação da ruptura e exprime a perfeição em sua natureza abrangente, por isso base para vários sistemas: teológico, cronológico, sociológico”, e porque não dizer, fílmico? Sim, dentro do cinema podemos tentar agregar o número três (representando a perfeição) aos filmes.
O conceito de trilogia é muito interessante e válido. Para compor uma trilogia não é necessário que a história seja interligada, ou seja, que os personagens do primeiro filme estejam presentes no segundo e terceiro e que os três filmes fechem um grande arco de história, por exemplo: De volta para o futuro I, II, III; Guerra nas estrelas I, II,III; Poderoso Chefão I, II, III etc. Temos também a chamada trilogia temática, um mesmo tema é recorrente em três filmes, não sendo obrigatoriamente que uma história seja a continuação da outra. Nesse âmbito, temos como exemplo e motivador do texto, a trilogia dos dólares, dirigido por Sergio Leone, realizador italiano. Por Um Punhado de Dólares (Per un Pugno di Dollari, 1963), Por Uns Dólares a Mais (Per Qualche Dollare in Più, 1965) e Três Homens em Conflito (Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo, 1965) são os filmes que comprovam essa teoria; o segundo não é uma continuação do primeiro e o terceiro não é do segundo, a única coisa que os une é o dinheiro e o protagonista. Este último, aliás, vinculado a uma imagem mítica, quase um escolhido, um herói que, apesar da ambição por dinheiro, não se deixa corromper e permanece com sua moral inabalável durante os três filmes, não poupando bala para derrotar os malvados, num estilo maniqueísta proposto pelo cinema clássico, ou seja, aquilo que Campbell afirma em seu texto A Jornada do Herói: “O objetivo moral é o de salvar um povo, ou uma pessoa, ou defender uma ideia. O herói se sacrifica por algo, aí está a moralidade da coisa. Mas, de outro ponto de vista, é claro, você poderia dizer que a ideia pela qual ele se sacrificou não merecia tal gesto. E um julgamento baseado numa outra posição, mas que não anula o heroísmo intrínseco da proeza praticada.”
Podemos observar em cada filme o gesto altruísta do herói vivido por Clint Eastwood. No primeiro filme, Por Um Punhado de Dólares, o herói sem ser apresentado, sem sabermos de onde vem (o que realça o caráter mítico do personagem) chega a um vilarejo que é dividido entre duas famílias (Os Rojos e Os Baxter). Ele então decide se aliar aos Rojos (família organizada por três irmãos Ramón, Estaban e Don Miguel), apenas por dinheiro. Chegando na casa, ele conhece o drama vivido pela personagem Marisol (separada de seu marido e filho) que é obrigada a viver como esposa de Ramón, o mais malvado dos três (primeira vez que aparece o número três). Durante todo o filme, o pistoleiro vivido por Clint, transita entre as duas famílias, fingindo ser aliado de ambas, até que ele resolve ajudar Marisol e fugir com seu Marido e filho dando-lhes todo dinheiro que havia conseguido. .Nesse momento, a narrativa toma um ar interessante, é o único que temos um vislumbre do passado do herói. Quando Marisol pergunta por que ele fez isso e ele responde: “Porque um dia eu precisei de ajuda e não tinha quem ajudasse”. Ramón descobre que ele ajudou Marisol a fugir, resolve espancá-lo e massacrar os Baxter. Durante o massacre, o pistoleiro consegue fugir, se recuperar e voltar dias depois, para desafiar o Ramón para um duelo, do qual o pistoleiro saí vitorioso.
No segundo filme, Por Uns Dólares a Mais, temos novamente o pistoleiro, dessa vez caçador de recompensas, que se alia a um ex-coronel que também trabalha como caçador de recompensas, na busca de El Índio, um bandido procurado que tem a cabeça a prêmio por 10.000 mil dólares. Novamente, a narrativa é pautada no dinheiro, os personagens tem a ambição de ficarem ricos e por isso matam. Porém, exatamente como o primeiro filme, o personagem vivido por Clint é movido pelos conceitos morais, o que torna um herói. Destaque para o duelo final, entre o ex-coronel e El Índio.
No terceiro filme, Três Homens Em Conflito, temos algo além do western, enquanto que nos dois primeiros filmes podemos classificá-los como westerns por excelência, nesse, o western e o épico estão presentes. Lembrando que segundo Aristóteles, o gênero épico apresenta narrações de fatos grandiosos vividos por um herói, como em a Ilíada, temos a figura de Aquiles, a Odisseia, a figura de Ulisses, Enéida, Enêas etc. Para fechar a trilogia, o título do filme tem três, reforçando nossa ideia de perfeição presente em todos os filmes. Esse último vem para fechar, um épico, o que os outros dois filmes já vinham apresentando. No último filme, temos a história de Tuco e Blondie (como o personagem do Clint é chamado), o relacionamento dos dois é dúbio o filme inteiro, não sabemos se são amigos ou rivais, o certo é que começam o filme como amigos. Tuco um bandido procurado é entregue ao xerife por Blondie, que recebe a recompensa e em seguida da um jeito de resgatar o amigo. Esse feito segue-se por diversas cidades, até uma em que não é possível o resgate e a relação dos dois fica abalada. Quando estão no deserto, encontram um homem no qual entrega a cada um uma pista de um tesouro que está enterrado. Daí começa a saga da busca ao tesouro que se dá durante todo o filme. No caminho eles encontram Angel Eyes, outro pistoleiro que está interessado no tesouro. De todas as belas cenas do filme, destacamos as duas principais, quando Tuco e Blondie estão em uma cidade abandonada pela guerra e ambos caminham pela rua principal matando todos os bandidos; a outra cena é o duelo final quando os três atiram uns nos outros.
Percebe-se que o número três é constante em todos os filmes, simbolizando a perfeição do realizador e do gênero western. E o épico presente não só pela proporção da terceira história, como pela junção dos dois primeiros filmes com o terceiro, como também pela trilha sonora emocionante composta por Ennio Morricone, pela direção de arte e fotografia que deram vida ao western dos filmes e pelo personagem vivido pelo Clint, pistoleiro que nada deixa a desejar aos heróis da mitologia greco-romana e aos heróis românticos, o primeiro por parecer envolto por uma aura que lhe dá a certeza do sucesso e a proteção dos males e o segundo por ser moralmente inabalável.
Por fim, fica a dica de ver e rever esses filmes 3 vezes mais.
Atual Vice-presidente da Aceccine e sócio da Abraccine. Mestrando em Comunicação. Bacharel em Cinema e formado em Letras Apaixonado por cinema, literatura, histórias em quadrinhos, doramas e animes. Ama os filmes do Bruce Lee, do Martin Scorsese e do Sergio Leone e gosta de cinema latino-americano e asiático. Escreve sobre jogos, cinema, quadrinhos e animes. Considera The Last of Us e Ocarina of Time os melhores jogos já feitos e acredita que a vida seria muito melhor ao som de uma trilha musical de Ennio Morricone ou de Nobuo Uematsu.